Considerada a travessia da maior praia do mundo, com 220 km de extensão, ela começa no Molhes de Rio Grande (RS) e termina nos Molhes da Barra do Chuí, divisa com o Uruguai. Mais conhecida como Praia do Cassino, fica localizada no extremo sul do Brasil.
Saí de São Paulo de carro e segui rumo à Porto Alegre onde iria encontrar os outros aventureiros. Renato foi meu companheiro de caminhada nesse desafio da atravessei da maior praia do mundo e Cheyenne nos acompanhou de carro como apoio.
Chegamos na Praia do Cassino com antecedência para organizar a logística. Comida, água, barraca, roupas, pontos de pernoite… tudo tinha que estar funcionando para conseguirmos cumprir o percurso nos 3 dias como planejado.
Começo da travessia da maior praia do mundo
Dia 1: Sol raiando, 7 horas da manhã e já estávamos prontos para começar a travessia, partindo dos molhes da Barra do Rio Grande. Algumas fotos, alongamento e vambora. Largamos como planejado e seguimos um ritmo forte de 7 km/h. A meta do dia era percorrer 65 km.
Os 20 primeiros quilômetros foram bons, aquecidos e descansados conseguimos percorre-los bem. Nosso corpo já dava os primeiros sinais de cansaço, assim como as primeiras bolhas nos pés. Troquei de tenis para amenizar a formação das bolhas e continuei.
A partir do km 25 começamos a sentir o que nos esperava. As horas passavam rápido mas não os quilômetros. A noite se aproximava e as pernas cansadas pesavam. Neste primeiro dia conseguimos percorrer 41 km. Por toda a extensão de areia existem dezenas de naufrágios, sendo o mais conhecido o Altair. Foi perto deles que decidimos acampar na nossa primeira noite.
Dia 2: Quanto você consegue andar em 1 dia? Essa era uma resposta que eu não sabia responder até o primeiro dia de caminhada. Acordamos literalmente travados. Os joelhos não esticavam e os tornozelos e quadril doíam. kkk
Começamos a caminhar e logo nosso corpo aqueceu. Durante o percurso, caminhávamos sobre a areia dura, com belas paisagens. As turbinas eólicas em boa parte do caminho pareciam nunca chegar e esse foi um grande momento de introspecção durante toda a travessia. A referência era o horizonte que custava em se aproximar.
Mar à esquerda, dunas à direita, céu acima, areia na frente e atrás. Esse foi o cenário durante toda a travessia. Para alguns, pode ser um tanto tedioso, porém contornei esse problema, focando no meu desempenho físico e mergulhando em meditação ativa, entrando em flow diversas vezes.
De repente avistamos um ponto mais escuro no meio da areia. Ao nos aproximarmos vimos que era uma tartaruga que estava virada com o casco para baixo. Pensamos que estaria morta, porém ela moveu e logo a desviramos. A colocamos na água longe dos predadores da terra e, continuamos nossa jornada felizes em termos salvado um vida.
O corpo depois de percorrer 28 km pediu descanso. A meta, que após o primeiro dia mudou, era chegar ao o primeiro farol Sarita. Missão cumprida. Dormimos cedo com muito vento e chuvisco.
Dia 3: Uma surpresa me esperava: era aniversário do Renato! O aventureiro resolveu passar o aniversário dele fazendo a travessia da maior praia do mundo. É Isso que eu chamo de comemoração!
As dores estavam em todos os lugarem possíveis. kkkk. Caminhamos 25 km no total quase nos arrastando. Os bastões de caminhada ajudam enormemente a sustentar as pernas duras. Por causa das noites mal dormidas e falta de suprimentos voltamos para a praia do cassino onde iríamos descansar e continuar do mesmo ponto no dia seguinte. Entre tantas risadas colocamos a culpa da nossa volta no aniversário do Renato. Até comemos bolo. 😉
Com essa volta para a cidade pudemos ir ao supermercado e descansar corretamente para encarar a travessia, que já se mostrava bastante desafiadora.
Dia 4: Ficamos praticamente a manhã toda nos recuperando das dores e só começamos a caminhada às 14 horas. Mesmo andando noite a dentro, percorremos apenas 23 km.
Preparamos e congelamos arroz com legumes, carnes, macarrão e vegetais. Coisas simples que seriam comidas nos dias seguintes. E qual o melhor jeito de esquentar a comida? R: No motor do carro.
Durante todo o trajeto nesses 4 primeiro dias, encontramos diversos animais na areia. Eram leões marinhos, pinguins e tartarugas, o que se repetiria durante todo o percurso. Alguns deles com vida, enquanto outros já mortos. Mais tarde fomos atrás do por quê de tantos animais na costa e descobrimos que eles se separam de seus grupos por estarem debilitados ou perdidos devidos à predadores e, infelizmente não conseguirão sobreviver sozinhos quando voltarem para o mar. Uma pena.
Farol Albardão
Dia 5: Acordamos animados com a proximidade do Farol Albardão e logo o alcançamos. O local abriga 2 faroleiros da Marinha do Brasil e alguns técnicos de uma empresa de radares. Eles trabalham isolados pelo período de 3 meses quando são substituídos pelos próximos faroleiros da Marinha.
O local pode ser visitado por turistas porém, devido a pandemia, estavam suspensas as visitas. Continuamos caminhando até o cair da noite completando 30 km andados.
Dia 6: Dia decisivo! Ficamos sabendo que 18 km adiante do Farol Albardão, apenas carros 4×4 conseguiam passar. Dito e feito. Atolamos o carro mas logo conseguimos tirar. Nesse momento decidimos continuar sozinhos sem o carro de apoio.
Decidimos ir com o carro todos esses dias para caminhar sem peso. Ele transportava toda água, comida e equipamentos. Dessa vez, teríamos que continuar com todo suprimento para 2 dias. 6 litros de água, comida, barraca, roupas.
Renato sentiu fortes dores nos joelhos e então passou o bastão para sua irmã Cheyenne, que me acompanhara por 2 dias. Apesar do peso das mochilas e das inúmeras bolhas em seu pé, caminhamos 40 km!
Foi um dos dias mais lindos! O trajeto chamado de concheiro pela quantidade absurda de conchas, era lindo. A praia se inclinava pouco, o céu estava limpo com algumas nuvens dando um belo efeito no por do sol.
Dia 7: Apesar da noite mal dormida, estávamos contentes por estarmos perto da cidade de Hermenegildo e mais contentes ainda por encontrarmos com o carro. A maior praia do mundo estava acabando.
Logo na hora do almoço chegamos na cidade e ficamos muito felizes por almoçar comida boa e quentinha.
Não demoramos para continuar. Dessa vez, completamente sozinho, o carro me esperaria no final, nos Molhes da Barra Chuí. Foi um trajeto muito legal, pois pude apreciar toda a imensidão desértica da praia completamente sozinho. Céu limpo, por do sol. Nem parecia que esses 7 dias de dores e autoconhecimento já estavam acabando.
Por fim, anoitecia e a luz do Farol do Chuí guiava a direção do término da travessia da maior praia do mundo. Lá nos molhes do Chuí, Renato e Chey, me esperavam com um belo vinho! Depois de 27 km percorridos neste último dia de travessia, consegui completar os 220 km de praia!
Dicas para quem vai fazer a travessia:
1- Não há absolutamente nada pelo caminho. Portanto deve-se levar tudo que for utilizar para os 6 dias, incluindo água. Existem durante toda a praia, poços de água logo acima da areia, porém não recomendo utiliza-las para consumo. Sua cor esverdeada não é muito convidativa. Muitas delas ficam paradas e podem conter dejetos de outros animais.
2- Pensem em ir com carro de apoio. Ele foi de grande ajuda em diversos momentos, carregando equipamentos, água, descanso, abrigo da chuva. O perrengue seria 10 vezes maior sem ele.
3- Melhor época para ir: os aventureiros que fazem a travessia da maior praia do mundo costumam ir durante o verão, entre os meses de novembro e fevereiro. Nessa época o céu pode estar mais limpo e o tempo mais ensolarado, mesmo podendo haver chuva.
4- Há uma discussão geográfica e política a respeito da “maior praia do mundo” oficial. Isso se deve pela Praia do Cassino não se estender exatamente até os molhes do Chuí, tendo em seu caminho outros distritos, como por exemplo Hermenegildo. Em todo caso, é considerada a maior faixa de areia contínua do mundo, independente de quem pertença geograficamente, é do Brasil.